A comunicação do BC e o mercado

Portadores de más e boas notícias, os bancos centrais precisam de uma comunicação eficiente. O mercado, por outro lado, debruça-se com lupa para não somente entender as decisões das autoridades monetárias, mas, sobretudo, antecipá-las. Tempo é dinheiro.
A credibilidade do Banco Central é submetida a severo escrutínio em ambientes de volatilidade, incertezas, ferocidade na disputa por ganhos, acirrada defesa de posições e arrojados movimentos de realização de lucros.
Amanhã e quarta-feira o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) estará reunido para definição da nova taxa de juros, atualmente em 14,25%.
Conforme o próprio Banco esclarece, “as reuniões ordinárias são realizadas em duas sessões: a primeira, às terças-feiras, reservada às apresentações técnicas de conjuntura, e a segunda, às quartas-feiras, para decisões das diretrizes de política monetária”.
A divulgação das decisões do Copom é feita na data da segunda sessão da reunião ordinária, após o fechamento dos mercados. Uma ata, detalhando o processo de deliberação e os fatores considerados, é divulgada na semana seguinte.
O mercado aperfeiçoa seus instrumentos e busca, cada vez mais, segurança e previsibilidade. É um contexto também onde palavras mal ditas causam ruído.
No auge da recente corrida presidencial, uma superintendente de investimentos do Banco Santander enviou aos seus clientes de alta renda um texto afirmando que o eventual sucesso eleitoral da presidente Dilma Rousseff “deve piorar a economia brasileira”. O comunicado anunciava que juros e dólar iriam subir e a Bolsa desabaria.
A polarização eleitoral chamuscou a reputação do Banco, que mostrou controles frágeis na comunicação com os clientes, e trouxe a instituição bancária para o redemoinho das oportunidades políticas.
Mesmo que as “previsões” tenham sido de fato confirmadas, o episódio reforçou o cuidado entre opiniões expressas de analistas (prática comum no mercado) e a visão institucional.
A maioria desses relatórios, ao serem divulgados, em geral para públicos restritos, vem acompanhada por um rol de advertências: as informações e análises não são indicativas para nenhuma operação financeira, ou concretização de negócios, nem mesmo servem como orientação estratégia. Alguns bancos são categóricos ao esclarecer – de forma até espantosa – que não assumem nem a integridade, nem a confiabilidade e nem a exatidão das informações. Bom, poderia se perguntar, para que servem então?
 
Copometro: de olho na comunicação do BC
Quatro dias atrás, o Banco Itaú informou que publicará, na semana anterior à reunião do Copom, um novo relatório.
O departamento econômico do Banco, responsável pelo trabalho, informa na apresentação: “esse relatório condensa as informações econômicas relevantes com as nossas melhores estimativas das projeções de inflação do Banco Central (BC). Além disso, resume a comunicação recente através do “Copometro”, um índice que mede o grau de restrição ou expansão da comunicação do BC”.
Além de se basear em projeções e indicadores oficiais sobre a atividade econômica, o novo relatório levará em conta “os discursos recentes dos membros do Copom”. Vale observar: aqui entramos no terreno da subjetividade.
No primeiro relatório (26/02/2016), no tópico sobre Comunicação e “Copometro”, os autores debruçam-se sobre a ata anterior do Copom (publicada em 28 de janeiro) e acrescentam outro material: as falas e discursos expressos nas semanas seguintes pelos integrantes do Copom, que “reforçaram a sinalização da ata”.
Os analistas explicam que “para tentar antecipar as decisões do Copom”, a partir da própria comunicação do BC, “construímos um ‘Copometro. Classificamos as mudanças de comunicação entre as atas, como restritivas (+1), neutra (0) ou expansionistas (-1) e consideramos o índice em 100 em outubro de 2010. O indicador é composto por afirmações de atividade, inflação e de sinalização de política monetária”.
Com a devida transposição para gráficos, o Copometro aponta “a relação do indicador com a decisão do Copom na reunião seguinte”. Um exemplo: para a reunião de agora, desta semana, ”o indicador sugere que a comunicação da última ata é compatível com a manutenção da taxa Selic em 14,25%”.
A coleta de dados na imprensa é comum nesses relatórios e boletins. Sobre as projeções de crescimento do PIB de 2016, explicam, “fazemos a hipótese a partir de notícias na imprensa”.
Em entrevista para a experiente Angela Bittencourt, do blog Casa das Caldeiras – da redação do Valor Econômico – o economista Caio Megale, da equipe responsável pelo relatório, “explica que todas as declarações feitas pelos diretores do BC – em discursos, apresentações, entrevistas e documentos publicados pela instituição – são compiladas e registradas para análise e composição de uma matriz que gera um índice”.
Ao detalhar as premissas e objetivo do relatório, o economista explica que “o ponto de partida na confecção do ‘cockpit’ é a última ata publicada pelo comitê. Em seguida são agregados os indicadores e a comunicação do banco.”
Angela Bittencourt entrevistou ainda Laura Pitta, também economista do Itaú e que participa do ‘Copometro’. Ao reforçar que é feita “análise semântica na comparação das atas”, para daí extrair e classificar termos, Pitta explica que  “a comunicação do Copom está centrada no comportamento da inflação e da atividade econômica e também nos parágrafos finais da ata classificados como ‘policy’ e que dão o sinal da política executada pela autoridade monetária”.
Outro ponto, ressaltado pelo Valor Econômico, é fato do documento não levar em conta a comunicação de outros integrantes do governo. “Partimos do pressuposto de que a gestão da política monetária é feita de forma autônoma pela instituição”, afirma Caio Megale ao enfatizar que o documento considera única e exclusivamente a comunicação  do Banco Central.
O economista esclarece que o relatório vai procurar ser coerente com as informações e declarações feitas até a semana que antecede o encontro do colegiado.
Recentemente o presidente do BC foi criticado por divulgar, no primeiro dia do Copom, nota oficial comentando projeções e posicionamento do Fundo Monetário Internacional.
Dados não capturados, imprevisibilidade, nuances no comportamento dos agentes econômicos e notícias imperfeitas fazem parte da realidade. Talvez não caibam mesmo em boletins e relatórios financeiros, por mais atentos que sejam à comunicação.
Fonte: Armando Medeiros de Faria – editor de Conexão Pública. 01/03/2016

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