A propaganda enganosa dos delegados de polícia

 

De um lado, descrédito dos políticos e desprezo à política. De outro lado, valorização do papel do Judiciário e prestígio para as instâncias do Estado encarregadas da fiscalização e controle. Se não for bem dosada, principalmente na comunicação, a mistura dos dois campos gera abordagens inadequadas.
É o que acontece, por exemplo, na Campanha de Valorização dos Delegados de Polícia de Minas Gerais, iniciada em agosto passado e ainda visível, por exemplo, nos telões de propaganda do Aeroporto de Confins-BH.
Á primeira vista, se o telespectador, leitor ou ouvinte estão distraídos a comunicação apresenta-se como algo legítimo, natural. Toda categoria profissional, bem como toda entidade de classe, tem o direito de, com próprios recursos de seus associados, construir plataformas de comunicação junto à sociedade.
Quando se escuta melhor, o conteúdo traz armadilhas, confunde conceitos e inverte papéis. O traço individual e de voluntarismo está emoldurado na repetição da primeira pessoa no discurso da propaganda (“eu sou”, “eu faço”, etc.). Mais adiante o sentido invertido, a mistura de papéis e a usurpação de poderes: “eu sou a sua liberdade”, “eu sou seus direitos”, “eu sou mais justiça”.
São frases que remetem ao papel de um super-herói do Universo Marvel.  A construção de uma sociedade livre, justa e democrática no Brasil é uma obra coletiva, pertence a vários atores sociais e instituições, inclusive os partidos políticos.
Ao valorizar o legítimo papel dos delegados, a propaganda acaba produzindo o sentido  de que existem cidadãos fracos (ou sociedade débil), “felizmente” submetidos à proteção de uma categoria profissional. Ora é a liberdade do cidadão, em suas diversas formas, que garante o trabalho eficiente da Polícia, e não o contrário.
O esclarecimento público sobre funções, responsabilidades e relevância dos profissionais delegados é inquestionável. Inserida no espírito do tempo no qual o papel das categorias típicas de Estado (juízes, procuradores, polícia) é embalado como empreendedor de ações heroicas, espetaculares, que salvam a pátria amada, a campanha tem, entretanto, enganos que não contribui para o devido reconhecimento social do que faz um(a) delegado(a).
Autor: Armando Medeiros de Faria , editor do Conexão Pública.
 

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