Presidente da ABCPública destaca papel estratégico da comunicação pública em aula magna no Senado

Presidente da ABCPública participou da abertura do curso de pós-graduação em Comunicação Legislativa e defendeu uma comunicação orientada ao interesse público e à democracia.

No dia 26 de maio, o presidente da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública), Jorge Duarte, ministrou a aula magna do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Comunicação Legislativa, no Instituto Legislativo Brasileiro, no Senado Federal. Em sua fala, destacou como a comunicação pode ser estratégica na formulação e gestão de políticas públicas, abordando os desafios específicos da atuação comunicacional no setor público, marcada pela necessidade de diálogo, escuta ativa e prestação de contas à sociedade.

Princípios e história da comunicação

 

Durante sua apresentação, Jorge Duarte destacou princípios essenciais que fundamentam a comunicação pública. Entre eles, ressaltou que comunicar não se resume à emissão de mensagens — o sentido se constrói na escuta e na interpretação do outro. “A comunicação está no outro”, afirmou, enfatizando o papel central do receptor no processo comunicacional. Também abordou a autonomia da comunicação em relação à estrutura organizacional: ela ocorre independentemente da intenção, sendo uma dimensão intrínseca ao fazer institucional. “Não existe fazer sem comunicar; comunicar faz parte da produção”, reforçou.

O presidente da ABCPública apresentou uma síntese histórica da comunicação institucional no Brasil. Resgatou a e evolução da comunicação governamental no País, mantida por Getúlio Vargas como ferramenta de promoção, censura e doutrinação ideológica durante 15 anos. Após a extinção do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), em 1945, o país passou anos sem um modelo oficial de comunicação estatal, até que o regime militar instaurado em 1964 reconstruiu a coordenação da comunicação em uma vasta estrutura, mais uma vez com foco em promoção do governo e controle da informação durante 20 anos. Jorge contextualizou esse percurso como parte da formação de uma cultura pública marcada por autoritarismo, personalismo e comunicação entendida como divulgação, em que a transparência e a prestação de contas só ganharam espaço mais recentemente – mas ainda insuficiente. Para ele, essa herança ainda impacta como a comunicação pública é percebida no setor público: muitas vezes tratada como instrumento de poder, e não como um direito do cidadão ou uma expressão da sociedade democrática.

 

Comunicação e Educação voltado ao cidadão

 

Ao abordar a relação entre comunicação e educação, Jorge Duarte apresentou dados sobre o nível de compreensão da população brasileira. Destacou que um em cada três brasileiros é afetado pelo analfabetismo funcional e que apenas 10% da população possui nível proficiente — ou seja, são capazes de ler, escrever e interpretar informações em contextos diversos. Citou também pesquisas que revelam a falta de conhecimento cívico: cerca de 40% dos brasileiros não sabem distinguir as funções de um deputado e de um senador. Em um estudo internacional com 38 países, o Brasil aparece como o segundo povo com menos conhecimento sobre si, demonstrando percepções equivocadas sobre a própria realidade.

Para ele, esse cenário reforça a importância da comunicação pública como ponte entre o Estado e o cidadão em busca de uma cidadania esclarecida e ativa. Jorge destacou o crescimento de uma desconfiança generalizada em relação ao Estado — visto muitas vezes como inimigo —, um fenômeno global que se agrava pela ausência de canais claros de escuta, diálogo e prestação de contas. Para ele, o Estado busca propaganda, promoção, divulgação das ações enquanto o cidadão precisa de informação, acesso e canais viáveis de participação. 

Com base nesse diagnóstico, reafirmou que a comunicação pública deve ser orientada ao interesse público e ao fortalecimento da cidadania. Relembrou a definição oficial publicada no Diário Oficial da União, em 2011, quando diria o Núcleo de Comunicação Pública da Presidência da República: “Comunicação pública refere-se à ação de comunicação que se realiza por meio da articulação de diferentes ferramentas capazes de criar, integrar, interagir e fomentar conteúdos de comunicação destinados a garantir o exercício da cidadania, o acesso ao serviço e informações de interesse público, a transparência de políticas públicas e a prestação de contas do Poder Executivo Federal.” Chamou a definição de ‘funcional’, pois não é acadêmica, mas sinaliza como deve ser o comportamento da comunicação em uma instituição pública, orientando as práticas diárias.

 

Comunicação estratégica

 

Durante a palestra, Jorge Duarte apresentou um conjunto de diagnósticos recorrentes sobre os desafios da comunicação em instituições públicas, com destaque para as Assembleias Legislativas. Entre os principais problemas identificados estão a dificuldade de dialogar com a sociedade, a fragmentação entre equipes — que atuam de forma isolada, sem articulação —, e as limitações estruturais que afetam diretamente o desempenho da comunicação: falta de equipamentos adequados, espaços apropriados e recursos humanos. Jorge também mencionou a relação com dirigentes como um dos entraves mais comuns, em que a comunicação é muitas vezes subvalorizada ou tratada de forma meramente instrumental.

Ao abordar o conceito de comunicação estratégica, destacou: “Comunicação estratégica é o uso intencional da comunicação por uma organização para cumprir sua missão.” Com essa definição, enfatizou que a comunicação está sempre presente, mas precisa ser planejada e orientada por objetivos institucionais para produzir resultados. Nesse sentido, defendeu que a comunicação deve ser organizada, articulada e pensada como um processo essencial à missão pública, e não como algo acessório.

Jorge também reforçou o papel do comunicador público como um agente de mediação entre a instituição e sua razão de existir: o cidadão. Lembrou que o trabalho dos comunicadores não deve ser voltado à defesa da instituição ou de seus dirigentes, mas sim ao interesse público. Para ele, uma boa comunicação pública é aquela que reforça os direitos dos cidadãos, promove a transparência e a prestação de contas, amplia o acesso à informação e fortalece a cultura republicana. “A imagem institucional não se constrói por propaganda, mas pela utilidade percebida pelo cidadão”, concluiu.

ABCPública e Considerações

Ao final da aula magna, Jorge Duarte compartilhou a trajetória da criação da ABCPública, associação que surgiu como uma rede colaborativa voltada à qualificação da comunicação pública no Brasil. Fundada com o propósito de reunir profissionais comprometidos com o fortalecimento da democracia e da cidadania, a entidade iniciou com 10 e já conta com mais de 400 associados distribuídos por todo o país, em todos os Estados. “Acreditamos que, por meio do diálogo, da formação contínua e da articulação entre instituições, podemos transformar a comunicação pública em um instrumento estratégico e efetivo para o Estado brasileiro”, afirmou.

Com o espaço aberto a perguntas, Jorge destacou palavras-chave fundamentais para o aprimoramento da comunicação nas instituições públicas: resiliência e qualificação técnica para dialogar com lideranças resistentes; visão sistêmica e atuação cooperativa para superar a fragmentação entre áreas; uso de linguagem simples, canais acessíveis e temas de interesse público para alcançar uma população marcada por baixos níveis de letramento; e, por fim, produção de pesquisas com impacto e relevância, como ferramentas de convencimento institucional.

A palestra, além de marcar simbolicamente o início do curso de pós-graduação em Comunicação Legislativa, buscou oferecer aos participantes uma reflexão crítica e estratégica sobre os desafios e as possibilidades da comunicação pública como campo essencial para o fortalecimento das instituições democráticas.

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