Covid-19 muda estratégia das assessorias de comunicação

Profissionais com décadas de experiência à frente da comunicação de instituições ligadas à saúde pública brasileira participaram neste sábado (15) do painel “o que aprendemos com comunicação enfrentando a Covid-19”. O evento on-line integrou a primeira aula do Programa Avançado em Comunicação Pública, uma parceria da ABCPública (Associação Brasileira de Comunicação Pública) com a Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial).

Apesar de terem presenciado inúmeras crises internas aos longos dos anos, disseram que além da duração e impacto, a pandemia exigiu bastante das equipes e dirigentes e impulsionou mudanças permanentes na atuação da comunicação. Uma das transformações foi aumentar a importância e responsabilidade da comunicação nas estruturas dos órgãos públicos.  

O debate contou com a participação de Isabel Raupp, chefe da Assessoria de Comunicação da Anvisa; Elisa Andries, coordenadora da Comunicação Social da Fiocruz; Emily Gonçalves, coordenadora de Comunicação da Secretaria de Estado da Saúde de SP; Ricardo Azeredo, coordenador da Assessoria de Imprensa da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. O mediador foi Jorge Duarte, diretor de Relações Acadêmicas da ABCPública (Associação Brasileira de Comunicação Pública) e curador do curso.

“Neste momento, temos que convencer a gestão que temos muito mais contribuição a dar do que simplesmente um conteúdo de jornalismo. Como comunicadores, devemos trazer o olhar e a percepção das ações do ponto de vista da opinião pública e dos veículos de comunicação. É necessário estar presente aos gestores, levar elementos que devem ser considerados e batalhar por eles, o que pode impactar de maneira significante na estratégia planejada. Não podemos ser assessoria simples. Temos que ter consciência que podemos contribuir ainda mais.” É a opinião de Ricardo Azeredo, coordenador da Assessoria de Imprensa da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre.

Para Elisa Andries, coordenadora da Comunicação Social da Fiocruz, a proximidade do setor de comunicação com a gestão da empresa se tornou não uma opção, mas uma necessidade. “A gente tem que acompanhar a gestão estratégica, política e de comunicação da instituição. A Fiocruz já enxerga a comunicação como estratégica. Só conseguimos enxergar o que fazer numa crise, conhecendo as estratégias políticas e de gestão, senão não funciona”, conta. Já o aprendizado adquirido pela Isabel Raupp, chefe da Assessoria de Comunicação da Anvisa, durante a crise na saúde pública, corrobora com o fato de que o papel da comunicação pública na tomada de decisões mudou e não há mais volta. “Aprendemos que a comunicação institucional é importantíssima, mas, sobretudo, a figura da coordenação de comunicação tem que ter uma cadeira na mesa de decisão.  

A pandemia do coronavírus se tornou a maior e mais desafiadora crise para a comunicação pública do Brasil. Em pouco mais de um ano, a emergência sanitária estreitou a relação entre gestão e assessoria enquanto apresentava desafios e ensinava lições sem precedentes. Imagine então o tamanho da dificuldade encontrada pela responsável por coordenar a comunicação sobre saúde do mais populoso estado brasileiro e que sozinho contabiliza mais de 100 mil mortes causadas pela Covid-19.  Emily Gonçalves, coordenadora de Comunicação da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, afirma que apesar do grande “case” que é a pandemia, existem inúmeros outros obstáculos dentro dela. “Um dos maiores desafios para nós foi a questão do didatismo. Trabalhamos muito para descomplicar a ciência, com comunicação de conteúdo explicativo, utilizando metáforas. Encontramos uma maior oportunidade também para ensinar os cidadãos sobre saúde. Executamos situação técnicas, de uma forma didática com painéis interativos, dados abertos e infográficos. A equipe de comunicação virou produtora de conteúdo”, explica.

Além do desafio de lidar com uma situação inédita e muito mais complexa, o relacionamento entre os veículos de mídia e a comunicação pública também foi impactado na pandemia. Segundo Ricardo Azeredo, a estratégia adotada na Secretaria de Saúde de Porto Alegre foi a parceira e transparência total com os veículos de comunicação. “Focamos no contato direto com os jornalistas, mesmo diante do problema de lidar com um assunto tão complexo, com grande parte da imprensa com pressupostos poucos consistentes, baseados em senso comum e suposições em um ambiente turvado pela polarização política. Mantemos um canal intenso, permanente com a imprensa para fazer com que ela trabalhe ao nosso lado, e isso têm dado resultado”, afirma.

A polarização política e um melhor relacionamento com a mídia também foram obstáculos a enfrentar dentro da comunicação da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo. “Pensamos nos veículos de comunicação como aliados, visando o bem comum, com mapeamento dos públicos de interesse e buscando evitar a polarização política. Nosso trabalho não é para o governo, mas para o SUS, para o serviço público, para a população”, conta Emily Gonçalves.

Entre os diversos ensinamentos deixados para a comunicação pública por uma crise de emergência sanitária, que nem sequer chegou perto do fim no Brasil, é possível destacar a relevância de um trabalho de interesse público, que não parou em momento algum, pelo contrário, se reinventou para atender as demandas da população. “Pensando em comunicação de crise, no meio da pandemia, a Anvisa teve que começar a conversar com o público que era distante: a população. A palavra usada foi transparência. Abrimos as informações da Anvisa para todos, trabalhamos o uso e adaptação de linguagem simples e aprendemos uma lição: temos que pensar que nós somos veículos de comunicação, somos produção de conteúdo. Nós somos os próprios veículos de comunicação. Nós somos mídia”, disse a chefe da Assessoria de Comunicação da Anvisa.

O trabalho realizado por esses profissionais não é fácil, mas possui grande importância. O cansaço mental chega, mas a sensação de dever cumprido se sobressai. “Tem sido muito cansativo estar nesse ritmo de trabalho há mais de um ano. A comunicação é estruturante para saúde pública. Não há como trabalhar com saúde pública sem ter que ter uma comunicação forte e atuante. A gente precisa acreditar no que está fazendo. E eu acredito na instituição em que trabalho, no serviço público, e acredito no SUS”, declara Elisa Andries.

Texto: Sara Pereira

O Programa Avançado em Comunicação Pública continua ao longo dos próximos meses, com temas diversos relacionados à comunicação pública e comunicação estratégica. Veja aqui a programação completa e participe!

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