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Um dos maiores desafios da comunicação pública é a desinformação que vem “de cima”, aponta pesquisadora

No último sábado (15), a professora e pesquisadora da Universidade de Liverpool Patrícia Rossini palestrou, como convidada, sobre o estudo elaborado por ela, em parceria com Antonis Kalogeropoulos, chamado “Informação e Desinformação sobre a Covid-19 no Brasil”. Foi durante a abertura do Programa Avançado de Comunicação Pública, curso promovido pela ABCPública (Associação Brasileira de Comunicação Pública) e pela Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial). Os participantes debateram de forma on-line sobre os desafios dos profissionais de comunicação durante a pandemia. O título do seminário foi “O que aprendemos sobre comunicação enfrentando a Covid-19”.

Patrícia Rossini apresentou relatório produzido durante o pico da primeira onda de casos de coronavírus, por meio de painel online com mais de dois mil brasileiros. O objetivo era avaliar o contexto de informação e desinformação, além do papel e desafios encontrados pela comunicação pública.

“O contexto do estudo é que a crise de Covid-19 veio acompanhado do que a OMS (Organização Mundial da Saúde) chama de infodemia: uma sobrecarga de informações vinda de todos os lados. Buscamos entender quais os fatores que explicam a crença em desinformação sobre a covid no Brasil”, disse Patrícia.

A pesquisa trata o consumo de informação por WhatsApp no Brasil como um fenômeno. Um total de 81% dos participantes considera o aplicativo a principal fonte de informação. “O uso do WhatsApp para consumo de informações no Brasil tem crescido bastante. Segundo relatórios do Instituto de Jornalismo da Reuters, em Oxford, o WhatsApp é utilizado para notícias quase tanto quanto Facebook. O mais comum são conversas em grupos, onde na maioria das vezes são enviadas notícias sem link e fontes”, explica a pesquisadora.

Mas o que significa consumir notícias pelo WhatsApp e qual o perigo desta prática? É a indagação deixada aos por Patrícia Rossini aos profissionais de comunicação. Não há resposta exata, apenas fatos a serem considerados, diz: O WhatsApp é uma ferramenta popular, de fácil acesso e rápido compartilhamento de informações, verídicas ou não; e convivemos com uma doença que todos os dias se descobre um pouco em um cenário de polarização política em níveis jamais vistos.

O estudo aponta, entre os motivos da desinformação, o uso de sites partidários e/ou alternativos; a confiança e apoio à atuação governo federal; e a participação de grupos de WhatsApp com pessoas desconhecidas como variáveis que explicam essa crença persistente na desinformação.

Para a pesquisadora, o uso intensivo de mídias sociais amplifica o problema de disseminação de notícias falsas já antes instalado no país, o que torna ainda mais difícil para autoridades de saúde, de governo e de Estado repassarem aos cidadãos informações de credibilidade. “É a descrença generalizada em instituições políticas e na mídia que abre espaço para os discursos polarizados. Você não sabe mais em quem acreditar, já que a notícia chega por vários meios,” explica.

A pesquisa quantitativa, disponível no site da Universidade de Liverpool, não apresenta soluções para o grande problema de desinformação no Brasil durante a pandemia da Covid-19, mas provoca questionamentos aos profissionais, reforçados pela pesquisadora. “Um dos maiores desafios da comunicação pública é que a desinformação vem de cima, o que a torna muito mais danosa. O inimigo às vezes é o próprio governo federal. Então, como confiar em uma fonte que deveria ser oficial?”, indaga Patrícia Rossini.

O relatório de pesquisa

O estudo foi realizado durante o primeiro auge da pandemia no Brasil, em julho e agosto de 2020 em duas etapas (2.010 na primeira e 1.378 pessoas na segunda), utilizando painéis on-line pelo Ibope Inteligência. A pesquisa faz parte do projeto “Está no WhatsApp, então deve ser verdade: Mídias Sociais e acesso a notícias como caminhos para explicar desinformação e comportamentos sobre Covid-19”, financiado pela Universidade de Liverpool.

Patrícia Rossini e Antonis Kalogeropoulos, ambos da Universidade de Liverpool, destacam que um terço dos respondentes diz evitar notícias sempre ou quase sempre. As pessoas mais propensas a evitar notícias se auto identificam como politicamente alinhadas à direita do espectro político. O principal motivo citado é a percepção de que o noticiário sobre o assunto é “muito repetitivo e provoca mau humor”. Os cientistas são as fontes de informação consideradas mais confiáveis. A confiança nas fontes oficiais varia conforme o posicionamento político dos respondentes. Os que se identificam mais à direita estão mais propensos a confiar no governo federal. Nas conclusões, dizem que, quando se trata de fontes confiáveis de informação sobre a pandemia, a maioria dos brasileiros confia muito nos cientistas e na Organização Mundial da Saúde, mas a confiança diminui substancialmente quando se trata de autoridades nacionais e locais.

Também no relatório, os autores informam que a maioria dos brasileiros reportou ter visto informações falsas ou enganosas com frequência no WhatsApp e Facebook. Apenas um terço dos respondentes soube identificar informações falsas sobre a pandemia. As pessoas mais propensas a acreditar em desinformação sobre a pandemia tendem a se alinhar à direita no espectro político ideológico. Os autores dizem que a polarização da resposta institucional de diferentes atores políticos pode ter influenciado a confiança dos brasileiros nas informações, mas também “criaram mais desafios para os cidadãos navegarem por informações verdadeiras e falsas sobre a pandemia”. Similar ao que ocorreu no Reino Unidos, eles dizem que informações confusas vindas de autoridades e da mídia, torna mais difícil “distinguir em que e em quem confiar”. Para eles, “uma resposta eficaz depende principalmente da capacidade de divulgar informações precisas e confiáveis sobre medidas preventivas e restrições ao público”.

Texto: Sara Pereira

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